sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Ao atlântico

Se eu queria algum poder?

Queria poder sair:  daqui
                                           de vez
                                           do sério
                                           da  linha
                                           mais cedo
                                           de mansinho
                                           voando


E o mar? o mar não acaba nunca. A estrada? demora bastante pra terminar. Termina porque o mar é maior, e aparece. Vá até o fim da estrada, e tudo vira água. Saia. Eu sairia também, mas (mais) covarde é o receio que me habita. Estranho é querer tanto uma coisa, como queremos tanto tantas coisas, e apenas vigiá-la de longe. O olhar basta ou atenua. Não deveria. Melhor se atiçasse, impulsionasse. Ontem renovei meus impulsos de aventureiro. Ontem acumulei mais planos de fuga. Uma hora a gaveta enche de projetos, e há de se fazer algo: joga-se fora ou aplica-se. Aquele filme sabe muito de mim. Investigou meus anseios e os apresentou à telona. O acaso, a falta de ação, o olhar acentuado em detrimento dos sentimentos, o seio branco da mariana ximenes, a diretora no após, a saborosa velhice nas palavras, o caio em suas paixões-relâmpago, a descida da augusta, o outro seio dela, os finais todos, a rodoviária do tietê, o tal do hotel, a sensação de que quase sempre vale a pena, o cansaço. Isso sou eu, e estava ali: no convite, no filme, no voltar pra casa, no ter de escrever sobre isso, no não tentar clarear as idéias, mas sim libertá-las. Pegou, pegou. O que não sacar critica, invalida, esquece, lê de novo. A tal da kinderovologia do melamed. O danoninho que dava pra colocar no congelador e virava sorvete. Há algo melhor? Não há: a minha combinação preferida (agora) é estudar kinderovologia enquanto chupo um sorvete de danoninho. Ainda melhor se fosse na casa da árvore, com Tom Yorke fazendo um fundo musical. A experiência desse filme me fez bastante bem, mas isso não garante a recomendação. Vá ver "hotel atlântico" algum dia desses. Vá pelo seu deslocamento no mundo, por suas vontades mal-resolvidas, pela chance de cantarolar "socorro, não estou sentindo nada", pela bela fotografia, pelos ótimos Julio Andrade e João Miguel, pelos inesquecíveis seios da ximenes, pela vontade de usar um possível desapontamento para desfazer de mim em qualquer situação permissiva. Vá sim, me conte o que viu, como reagiu. Conte-me onde sua vida foi parar. A cena em que dois dos personagens vão ao encontro do mar é das mais belas que já vi. O mar, que "não acaba nunca". Ainda mais contagiado, saio agora, com danoninho e kinder ovo na mala, e vou à praia, pra ver se ela ainda é aquilo tudo mesmo.





________________________________________

Em cartaz no Espaço Unibanco da Augusta, São Paulo.

3 comentários:

Antes que eu me esqueça, digo: disse...

Pena.
Grandíssima penatédioarrependimentosaco.
Não li a tempo, não vi, não comento.
Troquei pelo corpo nu do senhor de 50 anos que – espero – não será inesquecível.
A falta de ação, sim, mas em vez do olhar acentuado, o desviar.
Pra além das minhas lamúrias, o texto é um convite ainda melhor que o de Apenas o fim.
Se te repete, me apetece. E aos outros leitores, talvez em menor escala. Talvez não.

Sair de danoninho e kinder ovo na mala é estar mais do que bem equipado pra desbravar o mundo, o mar, ir até o fim da estrada. E é também chave pra abrir a gaveta, o tempero pras palavras da velhice posterior.

Se tudo virar água, tudo bem poeta, pq vc mesmo disse “que já sabe nadar”.

Beijos

Camila de Sá disse...

Talvez não em menor escala... o que é ao mesmo tempo convite e a lembrancinha do casamento... rs. Esses textos têm o dom de misturar as impressões às expectativas. A sensação de já lembrar com carinho de alguma cena que muito se espera.
Mal vejo a hora - acabando as provas, estou lá! Espero que o filme em cartaz ainda esteja!
Parabéns, Noubar. Pelos textos acima e abaixo também...
Beijos.

Camila de Sá disse...

Ah, e outra: a Sarah escreve por demais! Lindo, lindo...