sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Sobre a Dança. E a Vida.


Como se bailar fosse fácil!

Como se agir fosse tudo. O "vai lá e pronto!". O "Se solte! Deixe que a música te leve, leve".

Quem não dança, quer dançar. Pode até saber quais são os movimentos aceitáveis pra cada ritmo, mas não consegue abstrair a matemática dos membros do corpo: não sente, calcula passos. Acha lindo assistir. Aprecia os exímios dançarinos que parecem ter raptado a desenvoltura de todos os que vêem as próprias pernas teimarem em não amolecer. Inveja cada deslizar, cada giro. Pergunta-se: "será que meu calçado é apropriado?"; "será que não é apenas uma questão de sobriedade inconveniente? (e estar ébrio ajudaria!)".

Inseguranças dos durões. Porque dançar é uma linguagem, e não dominá-la é viver com a impressão de ser um analfabeto corporal. A noite fica incompleta pra quem não dança. Mesmo a vida, parece que fica mais curta. Não é o máximo ver casais de velhinhos dançando nos bailes por aí? Tais cenas não configuram uma reação à inexorabilidade do tempo? Talvez nem seja pra tanto, mas dançarinos autênticos me alegram. E agora não falo apenas dos bons, mas de todos que dançam pra si mesmos. Os que dançam de olhos fechados, alheios à platéia. Olhos fechados mesmo quando abertos. Porque, se abertos, restritos. Enquadram um pequeno campo de visão pra ilimitar o mundo dos sonhos.

Fixar um olhar distraído e contemplar a imaginação, escorregadia e flutuante.

Falo, falo, mas não me dou muito bem com a dança. Pretenso músico desde o fim da infância, os ritmos sempre estiveram por perto, mas foram inalcançáveis aos meus pés. Fiz dançar, mas dancei pouco e mal. Quase nem tentei. Pulo carnaval, vagueio num som dos anos dourados, sem saber direito o que estou fazendo. Aceito os bons momentos sem interrogá-los. Os maus, torturo.

Hoje, vejo minha cabeça dançar. De mãos dadas com meu coração, deixa tudo rodopiando por aqui. Por memórias e projetos. Por sensações opostas e flagelantes. Inéditas.

Vida boa, e vida ruim. A incompreensão dos outros. A incompreensão de si mesmo. Tudo muito líquido e novo, esperando o que não se pode esperar; ou o que se pode cobrar apenas do tempo, vulgo infalível. Como numa dança, a magia pode acabar no fim de uma música, mas a parceria, nem por isso, fora em vão.

(A Vida entrou atrasada nesse texto. Minha intenção era falar apenas da Dança. E não é que as coisas se misturam sem avisar? Quando notei, a Dança era a Vida.)

Matei a eternidade.

Por não saber dançar, pisei no pé de nossa história.







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P.S.: Música, maestro!

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Oração

Essa é outra música, também não finalizada, mas nem tão aberta assim. Falta algo, mas talvez fique por isso mesmo. Na falta de tempo e de tino pra escrever, enrolo com canções! (quem não conseguir visualizar, apele ao youtube! :

http://www.youtube.com/watch?v=ofd_iE1ZA0Y



Oração


Se Tua força é maior que a minha
Não vou mais jogar
pra não perder
o que eu quero ser
se Você me deixar crescer

Se insiste em cortar a linha
Só vou me importar
em sobreviver
sem ver Você
prefiro não confessar
não mais brincar

E pra não Te esperar
Caminho só...

Deixo Teu jogo pra depois
Que há pouca vida pra nós dois
Não quero andar sobre o mar...
Porque sei na-dar!

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

"Eu escrevo e te conto o que eu vi" - II

"Ela é carioca, ela é carioca
Basta o jeitinho dela andar
Nem ninguém tem carinho assim para dar
Eu vejo na cor dos seus olhos
As noites do Rio ao luar
Vejo a mesma luz, vejo o mesmo céu
Vejo o mesmo mar"
(Tom/Vinicius)




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Ir ao Rio de Janeiro é trair a identidade paulistana. É admitir que praia de paulista é Shopping Center, e que aceitamos o empréstimo das belezas naturais de nossos "rivais", numa trégua oportuna e turística. É zombar do sotaque alheio, só que às escondidas, quando se tenta imitá-lo. É questionar o movimento de banhistas na praia numa tarde de dia útil (útil pra quê?), apenas pra não esquecer de nossa condição de trabalhadores vorazes e locomotivas do país. No íntimo, o que se quer é tirar o terno e a gravata e ganhar a vida sem tanta seriedade, mas o discurso segue sufocado pelo receio de ser ocioso; de ceder ao ritmo maroto do carioca, que, numa gradação da cultura "sombra e água fresca", ainda não chega perto dos rótulos destinados ao baiano, lento legítimo e folclórico. Paulista não confessa, mas queria sair dos trilhos mais vezes. Ir ao Rio é chocar a rotina. Ir ao Rio é o primeiro passo pra ir à Bahia. Da disciplina do escritório ao gozo do esporte à beira-mar. E daí ao ápice: rede e água de côco.

(Sim, tudo isso no "jeito classe média" de viver. Abaixo disso, fica o suporte pra todo o resto: aquele (a) que serve café no escritório; que monta a rede na praia; que abre o côco. Estes sobrevivem noutro plano, entre parênteses. E textos como esse não fazem a mínima diferença às suas vidas. Sendo assim, deixemos a hipocrisia de lado: falemos de nosso mundinho quase burguês como se ele fosse comum a todos, nesse exercício de culpa atenuada porque assumida (ha)... Pra aproveitar os parênteses: a cidade maravilhosa poderia ser maior. Poderia ser maravilhosa por inteiro, e não apenas pra nós, visitantes dispostos a comprar cartões postais. Mas não é.)

O Rio que eu visitei continua sendo lindo. A exuberância de seus momumentos; a energia de uma tarde no maracanã; a magia de um crepúsculo no Arpoador ("O mar: a tela cristalina. O Sol: o guache já no fundinho do pote"*); o charme de uma noite na Lapa; a indescritível sensação de ser passageiro do bondinho de Santa Teresa, naquele misto de transporte e museu ambulante; o clima bucólico do Jardim Botânico; e as praias todas. Se topar imaginar (ou lembrar) tudo isso, adicione uma pitada de calor aos seus pensamentos. E sinta o Rio, como achar que lhe agrade.



Talvez esta tenha sido minha última viagem dessas férias. Fechou um ciclo repleto de bons momentos. De Joanópolis, pequena e pouco conhecida, ao Rio de Janeiro, imenso em suas famosas atrações internacionais, vivi dias que serão guardados com carinho e apreço. Contemplei grupos de amigos distintos, que distribuem suas qualidades no tempero de cada instante que compõe as viagens. Tenho mais histórias pra contar àqueles que sempre me esperam voltar. Compartilho emoções para revivê-las quantas vezes eu conseguir. Quisera eu passar o tempo vivendo, contando e ouvindo histórias. Não importa que sejam repetidas. São estas (as repetidas) que minha avó conta, sorrindo, e acreditando que sejam inéditas. Não deixam de ser. Ouço-as tentando esquecer o final antes que ele chegue e, assim, me tome a chance de errá-lo. É tão bom ficar surpreso com algo que poderia ser previsto!

Pois bem, trago anedotas do Rio. Lembrarei do David sendo impelido a comemorar um gol do Fluminense; dos caldos que a Geórgia levou na praia de Ipanema; do figuraça do Isidoro, companheiro de espera do bondinho; do mal-humor engraçado do maquinista do bondinho pra com os passageiros e transeuntes. E, como cada uma dessas historietas valeriam um texto, apenas as cito, como referência mnemônica. A partir de tais referências, posso remontar nosso fim de semana. A partir de fins de semana, reconstituo épocas. A partir de épocas não esquecidas ...

Posso ativar minha parcela carioca, juntá-la à minha parcela caipira, e me tornar um paulistano do acaso. Sem orgulho nem mágoa de minha morada. Um paulistano sem cidade natal. Sem raízes intocáveis. Urbano por mera coincidência.

Humano por pura persistência.



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"Confessando bem
Todo mundo faz pecado
Logo assim que a missa termina
Todo mundo tem um primeiro namorado
Só a bailarina que não tem
Sujo atrás da orelha
Bigode de groselha
Calcinha um pouco velha
Ela não tem"
(Ciranda da bailarina - CBH)


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*http://rabiscadores.blogspot.com/

P.S.: as férias vão acabando, e os textos vão ficando cada vez mais raros. é bem difícil falar de experiências coletivas. Esses textos não conseguiram abrilhantar as sensações das viagens. Elas foram inalcançaveis à minha pena.

Saudações aos companheiros de estrada!