quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

"Daqui a pouco: fogos em copacabana!"


Decidi passar o ano novo em casa, sozinho. Pra ver como é. Uma atitude que fere meus vinte anos anteriores. Serve pra distinguir a grandeza desse ano, de pretensa maioridade de espírito. As coisas se deram de um jeito legal...


(Um momento: o Luigi Barrichelli está aqui na tv narrando o sorteio da mega-sena. Ele é maluco ou é tão feliz assim? Na hora do almoço eu o vi na mesma emissora, falando da expectativa de apresentar o show da virada, descrevendo sua satisfação pelo privilégio de "servir" a um "mar de gente", em sua cidade natal. E ele falava com a mesma empolgação de agora. Que pique. Aliás, ele deve sair direto do Ipiranga - local do sorteio - pra Paulista. Pela alegria que ele quer demonstrar, ou está sendo muito bem pago, ou é muito cafajeste ator, ou é feliz demais mesmo. Deve ter tido um ano sensacional. Meu pai não ganhou o sorteio, pombas!)


Bom, agora posso continuar: minha trilha voltou a ser o jornal nacional. Só pra não perder o ensejo, vale o registro de que algumas vezes escrevo profundamente afetado pelo volume desse TV aqui do lado, vigiado por minha vó (o aparelho). Considerem isso.


Dizia eu que... o ano foi bacana.


(Putz, mas quem consegue se concentrar em meio a essas reportagens tradicionais que mostram a virada de ano nos países orientais? Japão, Austrália: sempre! Qual a diferença dessas queimas de fogos? E já vem aquele papo de maior queima de fogos da história na cidade x. Meu cachorro ainda morre de medo de bombas. Não importa! Sem mais digressões globais!).


Ah, e agora cabe uma auto-crítica: meu texto, tal qual a reportagem, também é óbvio. Pega carona com a data e com o clima. Estou aí. Pois bem, não o consideremos "texto". Como definição lhe delegarei o rótulo de folha virtual de um diário que não existe. Uma espécie de confessionário eventual e oportunista. Contradiz minha "rebeldia" de abdicar da festa familiar pra explicitar minha indiferença às efemérides. Só existe pela ocasião. Hoje vivo, de fato, um dia importante, mas de um modo menos espetacular: continuarei assistindo aos viciantes episódios de "Six Feet Under " ("A sete palmos") e me envolvendo com a família Karamázov. Ao menos enquanto os fogos me permitirem. E hoje isso é relevante pro meu último dia de 2008. Um dia de solidão desejada, em que a interação se resumiu em dar o aval às vestimentas das mulheres aqui de casa, especialmente produzidas para o ano que vem. Agora me veio à mente: será que minha vó e minha mãe não terão seu empenho desprezado por minha ausência à casa de meu tio? (local da festa de logo mais). Pensando bem, se eu notar que isso pode se dar, até vou! E não por um ato de "caridade", mas pelo prazer de vê-las satisfeitas e recompensadas: isso pode valer a noite. Se, de outra forma, eu atestar a indiferença de minha presença à alegria delas, fico! E, aí sim, num gesto de "caridade", acolho o Bolinha (cachorro que tem medo de bombas) aqui na sala, e lhe ofereço os gatos.


Desfragmentando esses doze últimos meses:


(Bom, não dá mais: começaram os links da praia de copacabana. Eu sou muito rabugento pra não me abalar com isso. A repórter ainda soltou um "feliz ano novo a todos!" Ela não deseja um feliz ano novo a todos! Desejamos morte ao Frank Aguiar, no mínimo! Na verdade só citei ele pelo prazer que tenho em pronunciar o slogan "Cachorrinho dos teclados"! é ótimo pra quem quer dar um tom pejorativo ao "artista"! Cachorrinho dos teclados! Certo, que ele não morra. Tem família, não é mesmo? É justo que sobreviva. Que ninguém morra e a repórter esteja com a razão. Os felizes tem de estar com a razão. Supondo que ela seja feliz, claro. Enfim, está em copacabana no reveillon e, na hipótese de isso ser invejável, ela ao menos Está feliz.)


Dizia eu que... bem, já estão soltando bombas (21:17 hs). Eu considerei que fosse algo semelhante a um ensaio, treino. Meu pai foi mais ácido e blasfemou: "o pior é que esses caras não têm onde cair morto, mas têm dinheiro pra comprar rojões!" Ano novo também é isso: oportunidade de disputa pirotécnica. Deleite do caos! Contemplação do barulho que adorna uma noite que poderia ser uma outra qualquer. Se é pra ser honesto, admito que até estou com vontade de rever alguns tios e primos, mas talvez prevaleça a preguiça de cumprimentar dezenas de pessoas, sem a mínima originalidade nos votos, nem a mínima coragem de fugir muito de um "feliz ano novo" seguido de um abraço.


Sobre o ano que se passou:


Nem sei mais o que dizer. As palavras foram se moldando de acordo com as interferências aleatórias da sala de casa. Agiram por conta de minha vulnerabilidade de caráter. E agora cheguei a um número de linhas que beira a um limite. Mais que isso ultrapassaria o desejável pra um início de ano, que imagino ser o tempo em que você lê. Exausto dos temas natalinos e ano-novistas, terás ainda o aborrecimento de ter sido alvo de uma armadilha textual (do meio, entorno: uma armadilha determinista! falei), cujo efeito também sofri. No final, não falei das mazelas de meu ano, tampouco de tantas coisas agradáveis que você mesmo me proporcionou. O mote de uma retrospectiva perdeu sua chance e cedeu espaço a um texto que só pode ser um último. Não há mais paciência pra contar nem pra "ouvir". Que fique pra outra hora.


De algum modo, porém, eu falei sempre de mim. Nesse ano todo, com mais afinco nos últimos meses, estive mais frequentemente por essas bandas. E meus dias não foram tão diferentes uns dos outros. Portanto, o que se passou nessa véspera, deverá fazer parte do ano novo. Tentarei manter alguma disciplina quanto ao número de postagens, num ponto que não desespere a mim nem a você. É possível que logo essa nossa sintonia se extingua, ainda que esse não seja meu desejo. Se este espaço pode servir preu fazer algo como um balanço do ano que morre, saiba que tenho grande prazer em tê-lo como parceiro de meus passeios em prosa. Que pude usufruir de todas as participações (diretas ou indiretas) que, já disse outras vezes, acabam se tornando novos textos. Que, por fim, ganhei um pouco mais de confiança em mim mesmo.


Contente-se com meus verdadeiros agradecimentos por sua generosidade leitora e, para continuar com meus enigmáticos paradoxos, com meus votos de uma vida melhor a todos vocês, nesse desatinado mas gostoso instante de felicidade.


Bum!




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P.S.: Dizia eu que... a aritmética!!!


P.S.2: pra me prevenir quanto ao maluco relógio desse blog, digo que comecei esse texto às 20:37 e o acabo às 21:48. Por sinal, é bem estranho olhar minha galera aqui atrás (pai, mãe e vó), estirados no sofá, prontos pra sair, me olhando com aquele ar de quem vê alguém em frente ao computador, e fala como se "internet" fosse uma coisa só, próxima do google ou do orkut. Desse lado, também olho pra eles como se assistir a uma novela fosse uma coisa só.









sábado, 27 de dezembro de 2008

O Natal de cada um. E o meu.



Uma parte significativa da família se reúne. Não por desejo momentâneo de encontro, mas por força de data. Os parentes ilustres e bem-sucedidos; e os apirantes a fracassados: parecem pedaços de um mesmo todo, sangüíneo. A mesa e as cadeiras são comuns a todos, assim como o ente mais velho, mais ou menos próximo de cada um dos presentes, e responsável pela compilação da estirpe.


Além disso, hierarquia. (im)Pura classificação.


Há os naturalmente carismáticos e agradáveis, a quem os cumprimentos são mais longos e sinceros - quase um priviégio -, e há os que só são recebidos pelo acaso do parentesco, pois, pra além disso, não possuem as qualidades requeridas pela sociabilidade: são geralmente introspectivos, abstêmios; não riem muito nem sabem fazer rir; não têm boas histórias pra contar; e disfarçam o deslocamento com periódicas inspeções em seu próprio celular. São os que solicitam rapidez aos minutos.


Aliás, uns contam suas viagens - passadas ou agendadas -; outros vêem as fotos, ouvem, e aprovam. Aqueles falam de empreendimentos profissionais vultosos; estes (que são minoria, hein!) ponderam suas escolhas. E procuram estágios ou empregos. Reflexos das classes que compõem uma mesma família, há os filhos. Os fidalgos e os desgraçados. Os que fizeram intercâmbio no exterior e os que ainda vão entrar numa escolinha de inglês. Muita inveja e indignação ocultados por sorrisos de "você merece" ("e eu não?").


Em tão aguardada noite, tudo isso conta. Da escolha do cardápio ao volume e qualidade dos presentes, nota-se a gradação humana: do mais festejado e querido ao mais alheio e relevado. Muitos se sentem realmente felizes nesses instantes de confraternização. Sentem prazer em esquecer as animosidades e desejar dias melhores a todos. Têm seu pretexto pra ver as pessoas aparentemente alegres. Outros se contentam em reparar nos vestidos repetidos e em torcer pra que alguém não ligue pra felicitar a família, dando ensejo às críticas relativas ao seu descaso.



Alguns ficam responsáveis pela compra dos mantimentos, pelos enfeites e pela oferta do imóvel; todo o resto desfruta. Às vezes, admito, lava a louça. (Mas que chatice! É natal!) Pois sim, conforto de um depende de esforço do outro. Há de se sacrificar o tempo e o trabalho de uns pra que outros possam celebrar de forma mais cômoda. Celebrar o óbvio. Admirar lâmpadas piscantes e coloridas. Nem as crianças acreditam em papai noel. Nem há esforço pra isso: tudo faz parte de uma lenda que não tem intenção de convencer. Nasce desacreditada, voluntariamente. Só resta o espírito natalino. Dá-se um video game de última geração ao filho e uma bola de plástico à ONG da esquina: solidariedade. O "eu faço minha parte".



Por fim, há os ranzinzas. Podem ser os mesmos introvertidos descritos no início desse desabafo, mas não necessariamente. Eles estão ali por algum motivo que transcenda seu livre arbítrio. Ou são filhos submissos e obedientes; ou cônjuges que cedem à vontade do parceiro; ou agregados, que, por não terem laços familiares suficientemente arraigados a ponto de constituirem sua própria ceia, se envolvem no camarão dos outros. No campo dos cônjuges, inclua os namorados (as) que comemoram à revelia. Estes lutam contra sua inibição e, ao mesmo tempo, tem de conquistar o carinho da família de seu amor. Celebram culpa e deslocamento.


Com seus sobrenomes inconvenientes, ocupam espaços escondidos nos cômodos de casas estranhas.


Esse é o meu ritual de natal. Não foge de todo o aparato do ritual cotidiano. Há vencedores e vencidos. Representação e espontaneidade. Como toda manifestação de alegria, ele atrai casmurros que procuram incoerências e desigualdades travestidas. Dá oportunidade aos observadores desleais que discorrem sobre o contentamento alheio. Esses que falam mal de tudo; que acham o ser humano um bicho bem estranho e inadaptado; que se deleitam em jogar água na champagne dos outros. Eu os conheço: alguns deles até se metem a escrever...


Após a meia-noite.


terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Literatura: (in) definições



Literatura é disfarce.


É inaugurar um boteco pra atrair ouvintes aos engodos de nossas mágoas. Castigá-los ou premiá-los, conforme seu estado de embriaguez. E o resto é encher linhas e esvaziar copos. Prosear sobre si, buscando afinidades. Fingir inventar, mas compilar: aproveitar-se de tudo o que chega a nós. Pensar em escrever sobre cada coisa que se passa. Forjar nelas a possibilidade textual. É o que faço. Falo de mim, numa espécie de busca de algo inesperado, porque restrito ao instante da escrita. Tem sincero empenho, mas é falso: ainda esconde aquilo que resguarda a credibilidade de quem escreve; o singular; o indizível. O que não quer ser alcançado.


Literatura é carência.


Escrever é sentir falta. É completar-se no moldar do alfabeto. E delegar ao outro o juízo sobre si. É jogar sujo: desculpar-se com as palavras. Mas sujeitar-se aos mais duros céticos. Alimentar o inimigo; enojar. Estimular o "puta, que bosta". E agradar também. Reiterar carinho. É vingar-se do mundo ao mesmo tempo em que lhe pede auxílio. Interpretar por não saber agir. Escritores são complexados. Não resistem às auto-avaliações. São neurastênicos sempre prontos às sensações extremas: ora demasiado contentes consigo; ora assaz decepcionados. A intensidade de tais sensações é pretexto pro texto. Empurra.*


Literatura é hábito.


Mais que tudo: um costume. Segue instintos, mas todos corriqueiros. Inspiraração vem com treino. Quando não vem, há sempre outros recursos. Como agora, basta falar daquilo que se almeja com as letras: teorizar. Reciclar seu modo de escrever pra ganhar tempo. E aí esperar um novo mote. Não decepcionar o hábito. Reforçar-lhe enquanto conceito para que não se desvirtue: hábito tem de ser cotidiano, quase natural. É, também, tornar involuntária a procura de uma imagem que complemente o texto. E depois pensar: "por que sempre tenho de colocar uma fotinha? mais uma atração? uma isca?". Acabo colocando. Se bem que... esse finalzinho talvez devesse estar na definição que vem logo a seguir. (mas valeu: equilibrou o número de linhas)


Literatura é enfeite.


Mais precisamente, é enfeitar. Premeditar metáforas, calcular sua recepção, fugir dos clichês. Maqueá-los pra lembrar que, ainda que hoje sejam clichês, um dia foram inéditos, e tiveram sentido. Remodelar esses sentidos é colocá-los sob o reino da forma. Submetê-los. Escrever sobre escrever é perfumaria. Ah, o rótulo de perfumaria! Cospem: "A vida segue dura, e a arte deve se engajar; precisa denunciar as injustiças!". Não vejo tanta transcendência assim. Literatura é ornamento. Que mal há?** Necessitamos de oxigênios diversos: esse é o meu maior. Conscientizar é coisa pra gente grande. Mudar o mundo é um fardo pesado demais pros escritores. Os amadores, então, vish... são isentos pela inexperiência. Enfeitemos nossas árvores de natal com luzes chamativas, que basta.


Literatura é remorso.

Por isso aí acima. Porque sempre há uma sensação de inutilidade. Aquele "tá, e aí? o que muda? aonde quer chegar?" E aí que nos resignamos em ser inócuos aos grandes problemas do mundo. Ao menos por aqui. Que centremos nossas forças transformadoras em outras ações, concretas. Ou nem isso, porque também há muita falácia. Por enquanto, só remorso incompleto. Desconfortos de fachada. Incomoda, mas não o suficiente pra impedir nada. É o "sofrer" de longe. O "dói mais em mim do que em você": blá, blá, blá.

Literatura é paciência.


Isso mesmo: a sua. De chegar até aqui. Infeliz! Seu prêmio, sei lá... é seu próprio sorriso, de agora: esnobe, indeciso ou satisfeito. De que lhe vale? Ao espelho!




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E é mais um monte de coisas. Que o digam vcs. Estas são apenas as que me vieram aos dedos nesse momento. Agora, publicado, já me vieram outras definições, mas perderam sua oportunidade. Não coloco os créditos da imagem por não tê-los encontrado.

P.S.: Carol, isso se deve ao que vc falou aquele dia Nou Bar, sobre eu escrever sobre o próprio ato de escrever. Na verdade, vc falava de blogs, mas...tem a ver, porque o blog é onde publico, e me exponho. Bom, foi um estímulo seu, de um modo ou de outro.


*Demasiado contente! Pelos recentes textos de Camila e de João (Odisseu), que me estimulam pra caramba!; pelos comentários do último texto, que foram realmente outros textos, anônimos ou não; pelas férias que se anunciam ociosas!; pelo clima de natal (mentira!).


**cacófato notado, mas que seja! Que mal há!?

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O enterro do prodígio


Não é bem um fracasso. É a relutante constatação de que não dá mais. Não há mais tempo pra tornar-se notável ainda jovem. O garoto prodígio morre sem ter nascido: fora sonhado e vivera sob a suposta incompreensão do mundo, perdido num espaço onde o irreal potencializa talentos inalcançaveis. É preciso renovar os planos de um futuro. Encontrar novos pretextos para pensá-lo promissor. À medida que a precocidade vai sumindo, há de se transferir a esperança aos feitos adultos. Uma boa experiência profissional poderia substituir o sentimento de realização inviabilizado pela adolescência comum. Mais tarde virão herdeiros para novamente justificar a impregnação da noção de vitória. O que não pude ser, meu filho será. Virá ao mundo como vítima da cobrança de seu próprio pai. Sob a máscara sincera de uma boa educação, será moldado desde criança. Falará inglês pra que não corra o risco de não compreender muita coisa boa que há por aí. Estudará música antes de pensar em fazer barulho com um violão. Tudo emoldurado pela idéia de "prepará-lo melhor para o mundo": pra sua crueldade travestida pelo tom sadio que a palavra "competição" imprime à essa bagunça humana. Uma tolice tremenda, mas que de algum modo nos acompanha: conquistar prestígio. Ser melhor que esse ou aquele... nisso ou naquilo. Pra minha tristeza, careço de impulsos. O oxigênio sofre suas mutações etárias, mas a necessidade de respirar persiste.

Quão natural seria colher da vida apenas seus prazeres, sem pensar em legados! Mas a vocês não parece uma relação parasita demais? Tiramos dos artistas nossos maiores deleites. Muitos não viveriam sem música, sem cinema, sem literatura. A obra dos outros nos mantém. E o que fazemos? Trabalhamos vendendo aparelhos que reproduzam música alheia; em locadoras promovendo filmes "imperdíveis"; em feiras do livro... vendendo livros. Será que o "dom" realmente é restrito a uma pequena parcela dos seres humanos? Você é daqueles que acreditam que alguém nasceu com o talento pra criar coisas belas e outro alguém possui a inclinação congênita para catalogar peças de um acervo político? Há PESSOAS e pessoas? talvez sim. O transcorrer do tempo me tem feito desistir da busca de um fim em mim mesmo. Uma resignação quase que imposta. Quando nos deparamos com o "curriculum" daqueles que admiramos, vemos quanto foi precoce a constatação de seus dotes. Não é mais possível ser um grande jogador de futebol; não se pode mais compor algo como "Sabiá"* aos 21 anos; nem escrever Queda que as mulheres têm para os tolos** também aos 21. É a famosa crise dos 21. Chegar aos 21 e não ter feito nada disso! ah! "Você ainda é novo...".

Eu sou adepto do fracasso. Da consciência dos dias passados, que é mais forte do que a esperança pelos que hão de vir. Uma abordagem cética? Hoje, sim. Hoje eu me rendo à mediocridade sem considerá-la a pior das coisas. Digestão incômoda. Escrevo pra legitimar a desistência em palavras. E, na verdade, isso é meio pedante. Dá a impressão de que fico sempre me auto-decapitando para suscitar nos outros uma reação de resgate de minha auto-estima. Se publico, oras, é porque vejo sim alguma importância. No entanto, faço do texto uma total expressão do que considero ser minha existência mediana. Entende? É um lance contraditório: eu mesmo me culpo. Mas não é depressivo, como a capa pode sugerir. É uma tristeza de caráter: enraizada, até normal.

Declaro minha impotência frente aos desafios todos. Chego num momento em que minhas forças perdem muito de seu altruísmo. Migram pro lado de cá. Se não há nada muito complexo a oferecer ao mundo, que me seja facultado o direito do desfrute "egoísta". Que sejam abolidas as noções de trivialidade, banalidade, superficialidade: tudo é lícito e bem-vindo na festa da vida. Foi-se o mocinho. (pensou em "veio o vilão"? essa era a isca. Pra mais nada serviu o "foi-se o mocinho"...rs) Todas essas comparações o fizeram perecer.

BREQUE. Esse último parágrafo foi uma piadinha de mau gosto. Uma brincadeirinha. Uma vã tentativa de prolongar um assunto que se esgotou. Essa baboseira de "impotência" e tudo o mais são falsos. Embora eu realmente ache que meus tempos de prodígio se foram; a despeito de eu achar também que nunca terei sucesso em minhas empreitadas artísticas, ainda há a chance da rosa nascer no asfalto. Existe a motivação de escrever no blog (e isso é mais estranho do que qualquer outra coisa, pois amanhã sempre odeio o que escrevo hoje, mas depois de amanhã volto a escrever); a busca incessante de uma composição (que há de sair!): aquele quezinho de fôlego que equilibra e torna melhor o ato de viver. Têm razão aqueles que não esperam de mim nada de "especial"; nada além do comum. Que fique claro, no entanto, que isso não abafará meu desejo de surpreendê-los.

Sentem-se.


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*música que Chico compôs com Tom aos 21 anos.
**obra de machado de assis escrita também aos 21 (pra completar a dupla e gerar sua inquietação: "ah, ele quer mostrar que conhece chico buarque e machado de assis...se acha cult")

Sugestão de tema: Sr. Molina, após ver uma matéria que falava sobre um garoto de 20 anos que dirigiu (ou escreveu) um filme super bacana. Isso foi trágico para o gustavo, já que ele já beira os 23 e "nada fez". "Um bom tema pra vc escrever no seu blog".