terça-feira, 28 de julho de 2009

O nó de minha gravata

dada
dada


Não sei dar nó em gravata.


(Não entortem o olhar)


Não tomem por preguiça, ou tomem apenas pelo pouco que é justo tomar. O certo é que não quero aprender a dar nó em minha gravata. Descartem a idéia de que isso seja um modo de protestar contra o mundo corporativo. Ele é um desmundo, mas não é responsável por minha inabilidade com o acessório vestuário mais estranho que conheço. Meus motivos são outros, sérios.


Não amarro minha gravata pra não desapontar meu pai. Usando-a há quase seis meses, poderia ser vergonhoso admitir que nem suspeito como ajeitá-la, mas não é. Retirar dele essa tarefa matinal é que seria hediondo. Pais sentem orgulho em olhar pros filhos, vê-los entregues ao mundo, preparados (talvez não nos entendam tão bem). Meu pai apruma minha camisa, e me despede como quem diz: "já fiz minha parte". E aí já sou um anônimo homem, moldado, estereotipado, resignado. Pro Noubar que me fez junior, mantenho a fragilidade de quem não sabe se virar sozinho. Sustento a dependência paterna, e a enlaço com minha gravata, desamarrada.


(Não me ensinem)


Não o exploro. Assim como não maltrato minha avó ao permitir que ela ainda arrume minha cama. Obviamente, é mais cômodo pra mim. É mais simples (egoísta) cultivar relações que sejam onerosas apenas a eles. Aqui em casa, é assim: há territórios e ações que não podem ser desreipeitados. Gostamos de reiterar nossa importância. Há problemas quando alguém se mete a estender o lençol quando acorda, ou quando se recusa a oferta de um suco de maracaujá com leite. O ideal é sair atrasado, bebendo o suco num só gole, e dando um beijo na avó enquanto o pai dá um jeito na gravata. Ritualmente assim.


Não. Dias atrás baixei uns tutoriais na internet que ensinam a dar os sacais nós. Tem nó inglês, nó francês, e até português. Deixei na mala, pra qualquer emergência. Antes de consultá-los, porém, pensei no que esse desconhecimento representava pra mim. Pensei, pensei, e vim escrever. Contento-me em ser um respeitável amarrador de sapatos, em saber fazer a barba, e em ser razoável em despentear o cabelo casualmente. A gravata, deixo pra ele, como uma homenagem diária, personalizada.


(Não o substituam)



Ao meu pai, amplo.

domingo, 19 de julho de 2009

Qual mais?

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Ressalvas feitas, voltemos ao meu mundinho.

Preciso falar de uns rótulos que andam me atribuindo. Estou aí, mesmo pra isso, mas devo discordar de umas coisas, e explicar outras.

De cara, rejeito o título de tiozão. Pode? Pois sim, há quem diga. Uma amiga de um amigo meu, que mais tarde teria suas opinões avalizadas por outra menina, disse que eu tenho um baita "pique de tio". Comentário absurdo. Essas moças de dezoito estão sem muitas referências. Necessitam de uma reciclagem ótica, no mínimo. Noutros tempos, em que minha barba poderia sugerir um aspecto cansado, estragado, tudo bem. Hoje, com o asseio facial que o mundo corporativo exige, ando com cara de menino. Nem os trajes sociais poderiam justificar classificação tão inadequada. Mal entrei na vida adulta. Peço calma. Tenho de resistir ao menos a esse arquétipo. Tiozão, não. Próximo.

Que não venham com essa de que sou fresco pra comer. Há critérios, e eu os tenho. Molestam minha paciência com chacotas motivadas por minhas caretas-pós-anúncio-de-que-terá-berinjela-no-almoço. Berinjela é o de menos. Assustadoras mesmo são as bem-vistas escarola e abobrinha. Quanto às frutas, só não gosto das que quase todos não gostam: manga, pêssego (aqueles em calda é sacanagem), melão, mamão, entre outras. Só por isso, já me levam a mal. Quando entramos no terreno das sopas, dos caldinhos (verdes, de feijão, etc) e das canjicas, prefiro nem discutir. Vez ou outra é menos trabalhoso comer essas coisas cruéis do que ter de ficar inventando algum trauma de infância para recusar cada prato indesejado. Essa dos traumas eu deixo pro café: digo que meu avô derrubou em mim ou que café me lembra escravidão. Querem saber? O caso do café merece um parágrafo exclusivo.

Falo com segurança sobre o café, pois acabo de ler um texto do Antonio Prata em que ele comenta o mesmo problema: tem dificuldades de sociabilidade por não tomar café. Também posso desabafar. É algo quase ritualístico. As pessoas oferecem café como quem se apresenta a alguém. É um dos melhores primeiros contatos. Quem não sabe lidar com o "tempo pro cafezinho", que tome bastante água com açúcar. Faz sentido zombarem por eu optar por um Ninho Soleil ou um Yacult depois do almoço, ao invés de uma xícara do líquido energético? Não faz.

Como último de hoje, repudio o rótulo de nerd. Esse é mais circuscrito, mais zona leste. Entre meus parentes, amigos de infância, e vizinhos, sou tido como CDF. Isso soa de modo até bizarro, penso, quando alguém da faculdade lê. Lá, sou o autêntico picareta; aqui, estudo além da conta. É meio desconfortável ficar explicando pros tios o porquê de eu estar na graduação há cinco anos, e perigar ficar mais um. Como acham que sou um exemplo de dedicação, têm difuldades em entender a lentidão de minha formação, mas se conformam em dizer, sem muita base, que na usp o ensino é mais "puxado"(termo de tio, não? Não olhe pra mim, engraçadinho.). Acrescento o obstáculo que é o trabalho, a distância, e logo restabeleço minha imagem. Eu, o garoto da família que deveria usar óculos-fundo-de-garrafa e suspensório, e que possivelmente é fanático por RPG e xadrez. Leio pouco, e o que há dentro de meus livros envelhecidos são pornografia, tiras humorísticas, e figuras. Se letras, em fonte grande, gastona. Nada de filosofia ou outras leituras amaldiçoadas.

E saibam que, quando esse texto foi apontado por meus poucos pensamentos, havia outro rótulo, quase que principal. Ele faria a grande dupla com o do "pique de tiozãõ", mas escapou de minha memória por algum motivo desconhecido. Fiquei com esses três, e dei mais espaço ao do café. O outro, tão liso e indolente, não merece a importância que eu tinha lhe dado. Vejam, através desse esquecimento, o quão indiferente eu me posto aos estigmas que me oferecem. Descontraio, levo na boa. Na zl, levo "de boa", na maloqueiragem do falar.

As moças hão de ver o garoto que sou; a Carol descobrirá que muita gente confunde nozes com pedaços de madeira, e não come; pessoas gentis deixarão de me oferecer cafezinhos por aí; e meus colegas de faculdade irão rever seus conceitos, impressionados com minha capacidade de sustentar rótulos ginasiais. Seguiremos nessa selvageria classificatória, que é bacana. Cada um que se explique depois, ou que acate (rótulo de pegador é pra lá de bem-vindo. Um amigo meu adotou o "sobrenome" de "jumentinho" sem maiores problemas).

Linhas menos universais ainda, né?

Ao menos, que tudo esteja esclarecido.




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Imagem meramente ilustrativa. Não há tristeza no momento em que ela fora feita, só oportunismo fotográfico. Agora, há menos tristeza ainda!

Vá lá, tô sabendo.

Meus textos têm sido demasiado impulsivos. Mais meus do que seus, em suma. Têm registrado alguns momentos de seleta alegria, mas carregam um tom muito dedicatório, grato. Se às vezes eles dizem algo a você, é por certa identificação, ou por ternura. No mais, só narram experiências. Não chegam a ser memórias de um diário, mas se aproximam delas. Isso não é ruim, mas é restritivo. Condiciona sua recepção.

Esse espaço até já sondou criações ficcionais, e fraquejou. Fui levando, de relato em relato. De um tempo pra cá, quem não me conhece anda sendo prejudicado. As palavras que uso só são parcialmente suficientes aos visitantes mais remotos. O que elas trazem de carga implícita seria importante para a compreensão maior do texto. São opções, ou falta de.

Desculpo-me pela porção de "egocentrismo" que há em tudo isso, mas não prometo mudanças. Saiba apenas que estou ciente, e que, na medida do possível, buscarei assuntos mais "universasis".

(É até garboso ensaiar uma "conversa com o leitor". Dá uma áurea de diálogo. Dá a impressão de que alguém se importa com o teor de meus escritos. Quem lê, é cúmplice. Quase não reclama)

Um abraço!

terça-feira, 7 de julho de 2009

Paraty: relatos insuficientes, inacabados, (in)úteis

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Se nada der certo,
tenho pra onde ir.

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Não acabou. Inaugurou. Deixar a cidade fez parte do começo de uma viagem que aumentou meu mundo. Ela está em mim, em meus trajetos (meus trejeitos), em minhas mais novas calorias. Trouxe-me neologismos, literais ou não. É como se eu erguesse um cômodo no quintal de minha imaginação. Melhor, é como se eu ganhasse uma casa na árvore e a cedesse à minha mente. Meu ponto de vista foi alçado, encantado. Voltei pra casa e a suspendi a um lugar mais próximo do céu. Meus pensamentos estão condicionados às lembranças desses últimos dias. As pessoas que me vêm à mente; os lugares por onde passo; as coisas que faço: tudo é submetido a algum momento que por lá vivi.

"Lá, onde o sol descansa."

E onde seguiu recluso, sem tempo nem luz pra tanta gente. Fomos recebidos pela chuva, e por seu ombro amigo: o mar. A chuva, rainha vertical. O mar, rei do além-do-que-se-vê. Foram o que são, e trataram nossos sentidos com um imenso azul. A água, a areia, a Adriana, o Antunes*. A arte, ali. A combinação concebida pra ser breve. Restam seus ecos, infinitos. Fui tão disposto a me apaixonar pelo encontro, que acabei me apaixonando. Fiz da oportunidade minha redenção. Voltei a acreditar nas pequenas soluções para os grandes problemas. A acreditar que há literatura para todos eles (não falo de auto-ajuda).

(A vida é incrível! Enquanto espero que a marginal esvazie, escrevo dentro de um shopping center, sentado num lugar quase ermo, e vigiado por manequins que vestem roupas que nunca poderei comprar. O que justifica a digressão, claro, não é isso: é o fato de minha ex-namorada ter passado agorinha por mim, acompanhada, e nem me notar. Foi a primeira vez que a vi em tal situação, e não me importei tanto em ser um elemento de decoração. É...)



O texto será outro. Sou outro. As palavras estão contaminadas, mas é fascinante combater as sensações. Contrapô-las de súbito, quase à revelia, sem aguardar a maré baixar. Eu dizia que há literatura bastante a qualquer angústia. E há mar suficiente para qualquer olhar. Amar. Desamar. Ir ao mar. Secar. Voltar.

A princípio, uma festa literária. Daniel** diz ser mais festa do que literária. Hoje não lhe dou ouvidos. Hoje os críticos são meus inimigos. Hoje quero estar perto de quem achou tudo lindo. Quero ver Chico Buarque passar novamente pela janela de onde eu tomava um açai. Quero pensar outra vez: "de qualquer jeito eu poderei contar vantagem. Se corro e peço uma foto, farei inveja às inúmeras pessoas que gostariam de dividir uma moldura com o cara. Se permaneço estático, e demonstro certa indiferença à presença de meu compositor predileto, fico bem com aqueles que repudiam (hipócritas!) qualquer tipo de tietagem. Os que não admitem a transferência do carinho que temos pelas obras aos seus autores." Às vezes também digo essas bobagens. O Chico passou.

Minha namorada gritou que o amava. Ouvi, meio corno, meio aquiescente, e lamentei não ter me juntado a ela. Por dentro eu esbravejava carinho àquele final de semana, àquele lugar. À parada em São Luiz do Paraitinga, aos amigos crescentes, à lua cheia, às palavras ouvidas, vistas, tateadas. Muito nos valeu a resignação por acampar na chuva. O risco foi ínfimo diante de sua recompensa. Temos mais histórias a contar. Eu reservaria algumas postagens à FLIP, mas não sei no que vai dar. Não consigo me ater a textos temáticos, ordenados. Não agora.

Exalo meu alumbramento. Compartilho a fantasia de ter sido apresentado, de novo, a Manoel de Barros. De ter clichezado: "como vivi tanto tempo ser me dar conta desse sujeito?" São tantos os impulsos escondidos por aí, e é tão bom descobri-los.

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Quero a irregularidade daquelas ruas,
a magia daquelas janelas,
o barulho daquelas águas.

Vou-me embora pra minha pasárgada
Lá sou amigo do mar






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*Adriana Calcanhoto fez o show que eu mais gostaria de ter visto.
Antonio Lobo Antunes foi uma das gratas surpresas que tivemos por lá!

**Daniel Piza, jornalista/escritor fantástico, e que foi meu pirata numa foto papagaiada e mal-sucedida.