"Respirar
sentir o sabor do que comer
Caminhar
se chover, tomar chuva"
(arnaldo antunes)
Não é comum eu repetir temáticas. Menos normal ainda é escrever dois textos seguidos sobre eventualidades climáticas. É notória a irregularidade do tempo: que a minha também seja permitida.
Comprometi-me a falar sobre a junção de mar e chuva. De praia e chuva, na verdade. Essa mesma imagem que já deve ter surgido em sua cabeça. E as outras possíveis. É isso: vamos de praia, não só de mar.
Mar e chuva é dois; praia e chuva é par.
Mar é prosa: é todo extenso, sabe de tudo. É explorado devagarinho, vez em vez, com a certeza de quem sabe que irá encontrá-lo sempre, verde, azul, sem cor...ondulado.
Chuva é poesia: pode ser pequena, quase haikai. Pode ser grandona, quase lusíada. É devorada, arrebata, deixa todo mundo sem entender nada. Gera um sentimento sempre relativo. Chuva na cidade: inferno. No campo: vida. Na praia:
Esperem! Na praia. É disso que eu prometera falar.
A chuva chegou. Pense nela vindo pela voz do Arnaldo Antunes, da "epígrafe" ali de cima. "Chuva naquela voz é trovão"*. Chuva na voz do Lirinha, ali do "epílogo", é trrruvão. Na minha é papel. Escrevo minha voz pra não ter de falar muito. Chovo escrevendo c + h + u + v + a: chuva!
Agora, admitam, por mais que o sol seja automaticamente associado à praia, é lindo o encontro das águas, não? Ver o mar bebendo água. Ele, que chove em si mesmo, que é todo molhado, não manda na chuva. Espera-a. Quando não chove, o mar é sertão. É minguante.
Praia com chuva é deserto. Soa estranho praia e deserto, mas é o que é. E praia deserta é tão praia, tão bonita de ver. Começa a chover, e é contramão: famílias fugindo pros seus refúgios, areia esvaziando, e a chance de meninas chegarem correndo, cantando, traindo o sol.
A mão aberta, espalmada, conta-gotas.
E o ponto de exclamação não lembra gota, água? Sintam: ! (gota); !!! (chuva);
!!!!!!!
!!!!!!! (temporal)
(Procurando fotos que ilustrassem esse texto, o que eu mais vi foi gente se protegendo da chuva em plena praia. Tão desvirtuada fica a paisagem. Desvinculem de minhas palavras a noção de tempestades assustadoras, que essas também me afastam. No mais, deixemos chover. De leve, haikai, lembra?)
(Procurando fotos que ilustrassem esse texto, o que eu mais vi foi gente se protegendo da chuva em plena praia. Tão desvirtuada fica a paisagem. Desvinculem de minhas palavras a noção de tempestades assustadoras, que essas também me afastam. No mais, deixemos chover. De leve, haikai, lembra?)
Gosto de sol. Gosto, feito todos nós, de vê-lo nascer e morrer, mas também gosto de chuva. Daquelas cenográficas, de tardezinha, que vêm e desiludem o pôr-do-sol (sei que o que pareço estar dizendo é que gosto de praia, seja como for. E é, mas não importa, pois era a vez da chuva, ok?)
Que o sol venha outro dia, e eu o escrevo com igual prazer.
Hoje chove por aqui, e é como se eu precisasse estar na praia pra ao menos constatar meus exageros. Eles resistiriam, literários, prescindindo da realidade, que é tão mais distante... e não vale a pena.
"O sabiá no sertão
quando canta me comove
passa três meses cantando
e sem cantar passa nove
porque tem a obrigação
de só cantar quando chove"
(declamado por Lirinha)
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Texto resultante de uma proposta feita por Camila de Sá. Nós dois tínhamos de escrever algo sobre praia + chuva. Se quer mesmo me ser leal, vá ao blog dela e complete suas impressões! http://rabiscadores.blogspot.com/
* frase de camila de sá
P.s.: foi eu falar da chuva e pedir que ela não viesse na hora do futebol, e pronto: ela veio, no último sábado!
* frase de camila de sá
P.s.: foi eu falar da chuva e pedir que ela não viesse na hora do futebol, e pronto: ela veio, no último sábado!